Publicado em: 12/06/2020 23:20:14
Texto do Decreto nº 25.113 prevê os mesmos dispositivos de outros decretos que determinam explicitamente o lockdown em outras unidades da federação
por DIOGO MARQUES
O Governo do Estado de Rondônia editou o Decreto nº 25.113, de 5 de junho, que institui o “isolamento restritivo” nos municípios de Porto Velho e Candeias do Jamari, de 6 a 14 de junho. A decisão foi tomada a partir do acúmulo de óbitos e casos confirmados na região, bem como da alta taxa de ocupação de leitos de UTI. De acordo com as informações constantes no Boletim Diário nº 80, da Secretaria Estadual de Saúde (Sesau), até o dia 4 foram registrados 4.343 confirmações e 139 mortes na capital, enquanto em Candeias, 147 casos positivos e 2 óbitos. O estado somava até aquela data, 6.459 confirmações e 194 falecimentos em decorrência do coronavírus.
Dias antes, o site G1 Rondônia havia publicado uma matéria em que o Secretário de Saúde expressava a sua preocupação com a falta de UTIs para a internação de pacientes infectados com a Covid-19: “Infelizmente nossos leitos de UTI se esgotaram. Estamos à beira de um colapso, não só na rede pública, mas também na privada de Porto Velho. Ainda tem alguns no interior, mas são poucos. Isso é muito ruim. Precisamos da conscientização das pessoas”, disse. Além disso, o site da Sesau afirmou, em 5 de junho, que Porto Velho concentrava 67% do total de casos de todo o estado.
Diante dessa situação, portanto, o Governo do Estado resolveu endurecer as medidas para evitar a expansão do vírus com a publicação do novo decreto, mas evitou falar em lockdown. O Governador Marcos Rocha preferiu usar a expressão“isolamento restritivo”. Afinal, o que acontecendo em Porto Velho e Candeias do Jamari a partir do novo decreto estadual?
Governador Marcos Rocha fala sobre o decreto do “isolamento restritivo” (Fotos: Frank Néry/ Secom)
#Vacilou
Para responder a essa pergunta, vamos tentar esclarecer o conceito de lockdown e estabelecer uma comparação entre o decreto editado em Rondônia e em outras unidades da federação que adotaram explicitamente essa expressão. Como referência, usaremos como exemplo o Maranhão e o Pará. Vamos lá!
A partir da expansão do novo coronavírus em todo o Brasil, estados e municípios consideraram que as medidas de distanciamento social não haviam satisfeito às expectativas estimadas. Assim, tornaram-se necessárias decisões que restringiam ainda mais a circulação de pessoas e a oferta de serviços e outras atividades consideradas não-essenciais, decretando o lockdown. O site UOL, em publicação feita no dia 7 de maio,nos fornece uma definição prática dessa expressão: a palavra pode ser traduzida como "confinamento", cujo significado se refere a "estado de isolamento ou restrição de acesso instituído como uma medida de segurança". Ele se caracteriza pela rigidez ao determinar o bloqueio total de uma região, podendo ser aplicado pelo Estado ou pela Justiça. O cidadão é restrito de circular em áreas públicas sem motivos emergenciais, cruzar fronteiras ou divisas e muitas vezes pode haver toque de recolher.
Antes do último decreto, o estado de Rondônia vivia o distanciamento social ampliado, em que se recomendava permanecer em casa e evitar aglomerações (repare que não era uma proibição). Os cidadãos só deveriam sair à rua para necessidades básicas ou para trabalhar em serviços essenciais. É o que popularmente tem sido chamado no Brasil de quarentena.
O que mudou com o Decreto nº 25.113? No presente momento, vivenciamos o isolamento social restritivo, que serve “para conter o avanço descontrolado da doença e a recuperação do sistema de saúde, quando não eficientes as medidas de distanciamento social, a suspensão total de atividades não essenciais”. A determinação abarca “a suspensão total de atividades e serviços não essenciais e limitação das atividades essenciais, visando a contenção do avanço da pandemia da Covid-19, nos municípios de Porto Velho e Candeias do Jamari”, constantes no Art 1º, dos incisos I ao VIII. Além disso, continua previsto que as atividades e serviços essenciais deverão observar as restrições e as medidas sanitárias permanentes e segmentadas do Decreto n° 25.049, de 14 de maio de 2020 e protocolos específicos. Os serviços rodoviários foram suspensos e os aeroportuários, autorizados. Os trabalhadores das atividades que possuem o funcionamento autorizado, público ou privado, devem portar uma Declaração de Serviço Essencial com vistas a permitir que os órgãos fiscalizadores controlem a circulação. Isso vale também para os indivíduos que necessitem se deslocar e que não se enquadrem nas hipóteses acima. Por óbvio, há a previsão de sanções administrativas (advertência, multa e interdição parcial ou total do estabelecimento) e penais, previstas no Art 268, do Código Penal - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa -, cuja pena é detenção e multa.
Em linhas gerais, o que dizem os decretos específicos de lockdown? No Maranhão, foram proibidas aglomerações de pessoas em locais públicos e privados e a obrigação do uso de máscaras em todos os lugares públicos e de uso coletivo, ainda que privados, cujo funcionamento era permitido. O decreto listava, ainda, as atividades e serviços considerados essenciais que, apesar das especificidades de cada localidade, não fugiram muito daquelas permitidas em Rondônia. No que diz respeito às sanções administrativas e penais, o decreto no Maranhão prevê os mesmos dispositivos do Decreto nº 25.113, do governo rondoniense.
No Pará, o Decreto nº 729, de 5 de maio, em que pese as particularidades da região, era bem parecido com o decreto em Rondônia e no Maranhão. A lei previa a proibição da circulação de pessoas, exceto por motivo de força maior, com o uso de máscaras, nos casos previstos e com comprovação. As determinações proibiam, ainda, a reunião, pública ou privada, inclusive de pessoas da mesma família que não coabitavam, independente do número de pessoas, abrangendo também as atividades religiosas, que deveriam ser desempenhadas remotamente. Assim como o decreto rondoniense e o maranhense, o governo do Pará previu as sanções para o caso de descumprimento das determinações. Nesse caso, os órgãos e entidades componentes do Sistema Integrado de Segurança Pública e Defesa Social (SIEDS), bem como aqueles responsáveis pela fiscalização dos serviços públicos, eram autorizados a aplicar as sanções previstas independente da responsabilidade civil e criminal, de maneira progressiva e não taxativa, tais como: advertência; multa diária de até R$ 50 mil para pessoas jurídicas e de R$ 150 para pessoas físicas, havendo a previsão de duplicação para o caso de reincidência em ambas; e embargo e/ou interdição de estabelecimentos.
Em resumo, apesar das peculiaridades de cada localidade que decretou o lockdown, todos têm em comum a proibição de reuniões, aglomerações e circulação de pessoas como regra geral, exceto aquelas que deslocam-se por motivo de força maior ou de trabalho, quando autorizadas e comprovadas por serem considerados essenciais. As medidas sanitárias também estão presentes, em se tratando de lugares coletivos públicos ou privados, bem como sanções administrativas de advertência, multa e interdição do estabelecimento, além de outras previstas no código penal.
A despeito da negação do uso da palavra lockdown no decreto do Governador Marcos Rocha, fica evidente a similaridade com os outros dispositivos legais usados em outros estados do Brasil, que não ocultaram em outra expressão o significado real do endurecimento das medidas de contenção do novo coronavírus.
Fonte: ARUANA